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Sou finisher do IRONMAN 70.3 Cascais Portugal de 2018!


Só hoje consegui ultrapassar o meu estado meio catatónico e escrever algumas linhas sobre esse dia. Acho que no domingo esgotei todas as minhas energias físicas e psicológicas e estes 3 dias estive embrulhada numa ressaca monumental que me levou a um desinteresse total pelo evento em que participei, uma total indiferença pelo que consegui e uma aversão a qualquer desporto no mundo. Basicamente estive 3 dias em stress pós-traumático porque estorei com a mioleira durante as 8h04 que estive em prova. Sei que há provas muito mais dificeis neste mundo doido do desporto amador, mas esta foi sem dúvida a mais difícil para mim até agora.


O dia começou de noite (4h45) e de repente eram 6h45 e ainda tinha tarefinhas para efectuar no recinto e uma delas era ir à casa-de-banho. Ora as WC portáteis estavam com filas intermináveis e jamais iria sair dali a horas decentes. Quando fui ao carro deixar a mochila eis que reparo na bela da casa-de-banho do hipódromo. Vazia! Limpinha! 3 sanitas só para mim! Podia fazer um xixi em cada uma! Pensei, isto hoje só pode correr mesmo bem!


Na praia, uma nervoseira, tanta gente acordada àquela hora para nos ver, a família e amigos que se levantaram de noite para nos virem dar um abraço. Obrigada! Foi tão importante para mim ter-vos todos ali. A natação correu-me muito bem, depois de treinarmos meses na piscina e num mar quase só para nós, ninguém nos prepara para a selvajaria que é a primeira parte de um triatlo. Muita pancada levei eu e às vezes ainda me levantava indignada para refilar com quem me batia, mas entreguei-me. Entreguei-me ao mar e tentei ir encontrando um corredor onde me conseguisse deslocar sem apanhar tanto, e fui fluindo pelo mar que estava maravilhoso, sem corrente, com o sol a nascer lá ao fundo, estava absolutamente fascinada com a quantidade de cabecinhas laranjas e braços a nadar, achava aquilo do outro mundo, estava tão mas tão feliz!

A seguir começava o meu grande desafio. Demorei muito tempo na transição e consegui perder várias coisas pelo caminho. Uma das coisas que perdi foi a borrachinha para pôr o relógio no guiador e tive que o levar no pulso, logo não tão ao alcance da vista para controlar a velocidade, entretanto ele falhou por diversas vezes e estive a prova quase toda sem ter bem a noção da minha velocidade e em que quilómetro estava. Até Alcântara fui o tempo todo a falar sozinha, a dar-me força e coragem, no fundo no fundo senti que estava um bocadinho maluca mas estava a funcionar e continuei a conversa entre mim e o meu alter-ego. Percebi que no retorno de Alcântara estava a perder força e que a minha média não devia estar a favor para fazer este segmento no tempo limite, aquilo que durante as últimas semanas receei tanto. Sou lenta bolas e vou ter que treinar bike com mais empenho.


Sei que as subidas começaram e eu não fazia ideia onde estava, sou super distraída e vou muito focada na minha prova e acabo por me ausentar um bocado do sítio onde estou, estava no Estoril respondeu-me um polícia. Tantos polícias espalhados pelo percurso todo, sempre com uma palavra de apoio para dar. Começou o inferno da altimetria mas estava tão aliviada por já estar na fase pior da prova que enfrentei aquilo com toda a minha força psicológica e física. Aguentei-me à bomboca nas subidas, quase parada em algumas delas. Não fazia ideia que tinha passado o check-point da Biscaia com 1 minuto a mais do que era permitido. Tal era a minha alienação e falta de noção do tempo por causa dos problemas com o relógio que achava que estava perfeitamente dentro do timing. Lá em baixo no hipódromo a família e os amigos que me seguiam na app desesperavam com este minuto a mais, pois havia possibilidade de ser desclassificada e já não seguir para a corrida. Mas eu não, eu estava a desfrutar da descida, depois daqueles 70 e tal kms psicologicamente tão desafiantes e achava que estava à vontadinha. Chego perto do parque de transição, vejo um sinal a avisar para desmontar dali a 200 metros. 200 metros e o que é que apenas retenho do sinal? Desmontar. Desmontar! Faltavam 200 metros mas desencaixo os pedais na curva e como foi tudo tão atabalhoado porque a cabecinha já estava a começar a fritar, caio. Digo olá aos meus primos do Porto que vieram de propósito para me ver e que por acaso estavam ali naquela curva, vejo um hematoma a surgir na minha perna e fico logo mal disposta. Apeteceu-me começar a chorar como sempre me apetece quando caio, mas engoli a fita e segui para o parque. Cheguei ali e pensei ai caraças, agora vou descansar um bocadinho bolas, que 3h para a meia maratona chega e sobra... Começo a fazer tudo com muita calma quando o Nuno e o Marcos começam aos gritos para me despachar que só tinha 3 minutos para sair do parque. Oh não😱... Meti corda nos sapatos e segui meia azamboada da queda, da pressa, do cansaço, da má disposição dos géis.


A corrida foi só sofrer. Calor, exaustão e dores de barriga.

Mas tive o apoio maravilhoso de perto da minha família e amigos e amigos do triatlo, ouvia-os todos à distância, era tão bom. E quase no final a grande surpresa do dia, os meus pais. Os meus pais não gostam que eu faça estas coisas, ficam preocupados, acham excessivo e não compreendem muito bem o que me move. Mas no domingo estiveram lá, pela primeira vez numa meta que eu passei. E foi muito comovente! Nem conseguia quase correr quando a emoção me invadiu e lhes dei um abraço.


Cheguei ao fim já sem saber bem como me chamava, mas o meu fato denunciava-me e ouvi o meu nome durante o percurso todo! Foi mágico!


Em 6 meses consegui construir uma triatleta dentro de mim e apesar de ter dito no final que nunca mais fazia uma destas na vida, sei que o bichinho veio para ficar e que no final fica só o bom.


Obrigada a todos os que estiveram lá com uma paciência do outro mundo para esperar 8h04 por mim! E aos que não estiveram mas que é como se estivessem porque também foram incansáveis!


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